quarta-feira, 9 de setembro de 2009

MUSICOGRAFIA BRAILLE - Entrevista

Reportagem:
Claudia Souza


No ano do bicentenário de Louis Braille, criador do método de leitura para cegos, a Associação de Assistência ao Deficiente visual—Laramara, doou para a Ordem dos Músicos do Brasil—CRESP, dez máquinas de Braile. Com este incentivo, iniciou-se o curso de musicografia braile que está sendo desenvolvido em fase experimental, pela professora Isabel Cristina Dias Bertevelli e que acontece todas as quintas-feiras.
Para os novos interessados já tem matrículas abertas. O curso é gratuito e os participantes devem ter algum conhecimento de braile. Os novos matriculados serão entrevistados para que os grupos sejam divididos de modo que as aulas possam ser dirigidas para cada caso.
O público alvo são os músicos deficientes visuais e os videntes que tem interesse em dar aulas.
Na turma atual, primeiramente os alunos estão aprendendo as noções da musicografia braile para depois dividir o aprendizado para cada instrumento.
Existe uma correspondência entre as letras do alfabeto braile e as notas musicais. Os mesmos sinais que servem para escrever as letras do alfabeto, a pontuação, os sinais da informática, matemática e física possuem um correspondente na música. É preciso conhecer o sistema Braile para saber qual é o contexto, a fim de identificar se aquele sinal é uma letra ou uma nota musical. É necessário ter um conhecimento musical para aprender a musicografia braile.
A partitura em Braile para o cego representa uma independência. Em Braile não existe o pentagrama e nem a pauta. A partitura pode ser escrita pelo deficiente visual na máquina reglete, na máquina braile e no computador também. Existem softwares para que o deficiente visual consiga escrever as notas musicais. O Brasil está desenvolvendo o primeiro software neste sentido, no exterior, já existem vários. Para as apostilas do curso, a professora utiliza um software de escrita braile. Os alunos cegos recebem a apostila em relevo enquanto os videntes recebem uma apostila com os símbolos em braile negro.
O objetivo do curso é inserir o deficiente visual dentro do mercado de trabalho e proporcionar a sua inclusão nas escolas de ensino musical. Uma das suas dificuldades é encontrar escolas de música que tenham material em braile para as aulas. Com este método os cegos podem acompanhar as aulas junto com os videntes.

m!: Como o deficiente visual faz para estudar?
Isabel: A partitura musical em braile, não é o mais importante. Para estudar, o cego precisa desenvolver
muito a audição, percepção, ritmo, afinação; são tantos itens que a partitura acabando se tornando apenas como fonte de consulta para esclarecer dúvidas de acordes, compassos entre outros. O aluno vai ler e decorar os trechos. É fundamental a memorização.

m!: Para dar aulas em musicografia braile, é necessário algum tipo de graduação em música?
Isabel: Não. O objetivo do curso é realmente formar profissionais deficientes ou não para que eles possam dar aulas e também formar transcritores. O principal é que a pessoa que participe do curso consiga compreender o universo do cego, aprender a trabalhar com ele e transcrever a partitura em Braile.

A professora Jacira dá aulas de piano para cegos em casa e pretende aprimorar seus conhecimentos para aprender a transcrever as partituras. Ela disse que começou a dar aulas para cegos sem preparação nenhuma e foi desenvolvendo seus próprios métodos, até que uma de suas alunas lhe deu uma poesia em Braile. Foi quando resolveu aprender o Braile. "Os cegos são pessoas que aprendem facilmente, não discutem e não contestam nada. Quando chega ao final do curso que eles tocam, nem dá pra acreditar que fui eu que ensinei". Disse orgulhosa.



*Rodrigo Torres (foto ao lado) é músico tecladista da Banda América, composta por Deficientes visuais. Ele é afinador de piano e está fazendo curso para dar aulas aos alunos videntes.
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* Julio Machado
Outro aluno, Julio Machado, também é deficiente visual, compõe a Banda Projeto Síntese de Hip-Hop. É formado em violão popular e está fazendo o curso com o objetivo de dar aulas de violão em conservatórios. Ele dá aula para videntes.

Perguntei se é difícil dar aulas para videntes e ele respondeu que realmente é diferente: ―" No começo você acha meio estranho, mas eu percebo se o aluno erra pelo som. Quando isso acontece, eu coloco o dedo deles na posição certa no instrumento."
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Natural de Coupvray, pequena aldeia a leste de Paris, Louis Braille nasceu em 4 de janeiro de 1809. Ficou cego em 1812, aos três anos, após se acidentar na oficina do pai. Ao tentar perfurar um pedaço de couro com uma sovela, aproximou-a do rosto, e acabou por ferir o olho esquerdo. A infecção se expandiu e atingiu o outro olho, deixando-o completamente cego. Para desenvolver um sistema de leitura e escrita para pessoas cegas, ele utilizou como base o sistema de Barbier, utilizado para a comunicação noturna entre os soldados do exército francês. Em 1837, Louis Braille apresentou a versão final do sistema que, embora tenha levado algumas décadas para ser aceito na França, antes do final do século XIX já havia se difundido pela Europa e por outras partes do mundo.
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Informações: 11 3237-0777
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Matéria publicada na Revista músico! - nº 1 Setembro/2009 - Pág: 22 e 23
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Assista a filmagem da entrevista:

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Apoio Cultural:

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